Minha esposa e eu nunca teremos outro filho


Quando era criança, perguntei ao meu pai se ele acreditava em fantasmas. Eu estava assistindo Scooby-Doo, e as cenas granuladas de cores vivas estavam iluminando nossa pequena sala de estar. Olhei por cima do ombro para ele. Eu estava em um tapete na frente da TV, segurando com uma mão uma fatia de Velveeta (nt: um tipo de queijo processado) e com um par de biscoitos na outra.
"Você acha que os fantasmas são reais, papai?"

Ele ergueu as sobrancelhas com minha pergunta, colocou a cerveja no chão ao lado dele e se inclinou para a frente em sua velha poltrona.

“Bem, eu não sei, garoto.”

Quando perguntei o porquê, ele me deu um sorriso e disse que a ciência não podia comprovar ou não a existência de fantasmas.

“Então, isso significa que você não tem medo deles?” Perguntei. Sua expressão ficou séria.

“Não tenho medo de fantasmas. Mas tenho medo dos vivos às vezes.” Dei de ombros e voltei minha atenção para o desenho, sem saber o que ele queria dizer. 

À medida que envelheci, o mundo me ensinou que pessoas vivas eram muito mais assustadoras do que qualquer outra coisa. Mas sempre nutri uma esperança de que os fantasmas fossem reais. Mesmo depois que me mudei da casa de meus pais e conheci minha esposa, continuei me interessando por coisas sobrenaturais. Até eu comprar minha primeira casa. 

Minha esposa e eu crescemos em meio ao campo e cidades agrícolas; então, quando encontramos uma bela casa que precisava de reformas na Rua Acorn, achamos que morremos e fomos para a Disneylândia. Era uma casa vitoriana de dois andares, com um sótão e uma adega, e havia até uma laranjeira no quintal. Quando visitamos a primeira vez, o agente de imóveis explicou que necessitava de alguns reparos, mas não nos importamos. Isso só nos ajudou a crescer e criar laços como família. Minha esposa estava grávida de quatro meses quando nos mudamos para nosso novo lar. 

Vários dias depois, eu estava trabalhando na instalação de novos gabinetes na cozinha e minha esposa estava pintando a sala quando ouvimos uma batida na porta. Nossos novos vizinhos decidiram nos visitar: um casal de idosos que conhecemos como Terry e Debby. Recebi-os na casa inacabada, pedindo desculpas pela sujeira e agradecendo a torta de nozes que Debby havia feito para nós. Minha esposa convidou os dois para a sala de jantar, o único cômodo que havíamos terminado, e saiu dizendo que serviria as bebidas.

“Você é muito gentil, querida, mas deixe-me ajudá-la. Gravidas não devem fazer muito esforço.“ Disse Debby, olhando a grande barriga de minha esposa. As duas desapareceram na cozinha enquanto eu me sentava junto com Terry. Ele soltou uma risada sarcástica.

“Deb nunca conseguiu trabalhar grávida."

“Vocês tem filhos?" Perguntei, com bom humor.

“Ah, claro, três. Eles tem mais ou menos a sua idade.” Ele tirou o velho boné que estava usando e passou a mão em seu couro cabeludo.

“É bom ver outra jovem família se mudando... especialmente levando em conta o que aconteceu com a última."

Senti uma curiosidade mórbida crescendo em mim junto a um arrepio na parte de trás da minha cabeça e me inclinei para a frente na minha cadeira.

“O que aconteceu? Nosso corretor não nos contou nada.” Senti uma pontada de culpa quando seus olhos se encontraram com os meus. Seja lá o que houvesse acontecido, o entristecia profundamente. Mas antes que ele pudesse começar a contar a história, Debby e minha esposa voltaram para a sala de jantar. Elas colocaram xícaras nas nossas frentes e as encheram com um chá doce. Sentaram-se logo em seguida.

“Então, do que vocês estão falando?" Debby provocou, pegando a torta de nozes.

“Eu estava prestes a contar sobre os Turners." Terry respondeu gravemente. A cabeça de sua esposa se ergueu, seu rosto ficou branco.

"Oh, entendi..." Ela murmurou, colocando uma mão sobre seu peito.  Minha esposa estava estranhamente distraída pela torta. 

"Houve um acidente ou alguma coisa?" Perguntei.

"Mais ou menos", respondeu Terry, molhando os lábios em seu chá.” Os Turners se mudaram há dois anos. Eles tinham um filho que deveria ter quatro ou cinco anos. A mulher estava grávida. Ela se parecia com você, para ser sincero.” Disse apontando para minha esposa. Ela olhou para mim com nervosismo. Terry continuou:
"Ela teve o bebê, uma menina. Duas ou três semanas depois de ter nascido, a criança morreu. Síndrome da morte súbita infantil.”

Pigarreei. Qualquer rastro de excitação em relação a expectativa da história envolver algum tipo de assassinato ou coisas sobrenaturais desapareceu completamente. Pensar no horror que a família passou gelou minha espinha. Mas Terry não havia terminado.

“Após a morte da menina, o Sr. e a Sra. Turner se separaram. Dava para ouvi-los gritando e chorando. Turner começou a beber, e a Sra. Turner se afastou de tudo e todos, tornando-se reclusa. Nos oferecemos para cuidar do menino de vez em quando, e ele sempre ficava completamente quieto. Nunca olhava para nosso rosto.” Terry esfregou um de seus olhos.

“A Sra. Turner se matou alguns meses depois. Se jogou do carro em movimento. O menino estava no banco de trás e ficou preso na cadeirinha. A polícia chegou trinta minutos depois. O cérebro dela estava grudado em seu cabelo.” A voz dele começou a tremer, e então ficou em silêncio. Debby segurou sua mão e lhe deu um sorriso fraco e reconfortante antes de assumir o controle.

"Nós nunca mais vimos o Sr. Turner ou o menino depois disso. Espero que ela esteja em um lugar melhor.”

Ela inconscientemente tocou a cruz que pendia em seu colar. Desviei minha cabeça, encontrando os olhos da minha esposa. Ela tomou um gole de chá, tossiu e acariciou o ombro de Debby.

“Foi muito gentil vocês dois estarem lá para ajudá-los. Fiquem tranquilos, vamos ficar bem.” A mão dela descansou sobre sua grande barriga. O casal de idosos sorriu, e Debby rapidamente mudou de assunto, começando falar sobre as reformas da casa enquanto distribuía a torta de nozes. 

Muito depois de os dois terem saído, minha esposa estava no andar de cima enchendo nosso colchão de ar. Sentei-me na mesa da cozinha e encarei minhas mãos. Só de pensar na ideia de perder meu filho para algo que não posso evitar e ver toda a vida desmoronar era apavorante. Senti o medo atingir minha alma. Minha esposa me chamou para a cama, e logo depois caí em um sono agitado.

Três meses depois, estacionei minha Honda de merda na garagem e refleti em frente ao volante por um momento, respirando profundamente. Minha esposa estava em casa preparando o almoço. Eu havia ido comprar tintas para pintar o quarto de nosso bebê.
Uma garota. Nós iríamos ter uma menina.
Deixando os sacos plástico cheios de tintas de tons rosa pastel e amarelo em frente à porta, chamei minha esposa. Ela veio andando limpando as mãos em um pano de prato. "Temos as tintas da nossa menina?" Os olhos dela brilhavam de excitação. Mostrei as tintas a ela e beijei sua bochecha.
"O almoço está pronto. Vou pegar as amostras, subir e ver como as paredes vão ficar. Daqui a pouco eu desço! "

Eu havia acabado de colocar meu prato na mesa quando ouvi o grito. Subi correndo. Quarto à esquerda. Minha esposa, tremendo como uma folha, sentou-se na frente do armário aberto do quarto. No momento em que ela me viu, as lágrimas caíram e ela começou a soluçar. Eu me ajoelhei e puxei-a para meus braços, perguntando se ela e o bebê estavam bem, querendo saber o que aconteceu. Ela apenas balançou a cabeça e apontou sua mão trêmula em direção ao armário.
Franzi minha testa confuso, e olhei para cima. E então eu vi. E também comecei a chorar.

Porque meu pai estava certo há tantos anos atrás. A expressão sombria em seu rosto quando ele me explicou que o mundo real era muito pior do que qualquer tipo de fantasma ou monstro. Que as "coisas que assombram a noite" são apenas uma distração tola para esconder do que realmente deveríamos ter medo. E que, não importa quantas mentiras contamos, quer nos ajudem a dormir ou nos mantenha acordados, nunca nos protegerão da realidade.

Na parede do armário, rabiscado ao nível dos olhos de uma criança, estavam as palavras:

EU MATEI O BEBÊ

Creepypasta traduzida do autor(a) RistianCof

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